Sempre me perguntei o motivo que levava um gato a atravessar a estrada a correr mesmo na altura em que um carro circulava. Poderia ser uma tendência suicida, talvez um desgosto amoroso ou urgência em chegar a casa com saudades da ninhada.
Confesso que matei alguns gatos desse modo, sem hipótese de travar. De repente, aparecia um gato, qual seta, a desafiar a velocidade do meu carro. Alguns venceram. Infelizmente, outros foram vencidos pelos cavalos incansáveis do motor.
Decidi, então, gastar algum tempo a descobrir a razão deste comportamento bizarro. A pé ou de bicicleta comecei a passear nas estradas onde apodreciam alguns cadáveres de gatos. E comecei a notar que nas bermas havia grupos de gatos. Barulhentos e irrequietos: um ou dois gatos no meio do círculo, tremendo com um ar assustado, acossados. À sua volta dançavam e riam os outros gatos. Quando me pressentiam, todos fugiam.
Curiosa, comecei a voltar a esses locais, ficando sentada horas, escondida, à espera dessas reuniões felinas. Assim, consegui ver (juro que vi!) por quatro vezes, o mesmo comportamento colectivo.
Um, dois ou três gatos novinhos, tremelicando de medo eram acossados pelos machos mais velhos, os alfa, beta ou gama. Estes andavam em círculos a miando-lhes histericamente. Pontualmente, um ou outro se aproximava dos mais novos e miava, rindo com vontade, perto da cara do outro, que não se atrevia a responder. O auge desta dança diabólica acontecia sempre que se ouvia o aproximar de um carro.
Então, em terror absoluto, um dos novatos atravessava a estrada, correndo pela vida, esperando que a sua agilidade fosse maior que a velocidade do monstro de quatro rodas que se aproximava e que os outros deixassem de lhe chamar MARICAS!
Às vezes a corrida acabava mal, os mais velhos encolhiam os ombros e iam embora.